quinta-feira, 26 de julho de 2012

Desde que comecei a escrever essa carta eu já bebi (tomei? Entornei?) mais duas cervejas, então estou pronto para dizer isso agora. Lá vai, Em, nós nos conhecemos há uns cinco ou seis anos, mas só há dois anos somos, bem, "amigos", o que não é tanto tempo assim mas acho que sei um pouco sobre você e entendo qual é o seu problema. E fique sabendo que só tirei 2,2 em antropologia, por isso sei do que estou falando. Se não quiser conhecer a minha teoria, pare de ler agora.
Ótimo. Então vamos lá. Acho que você tem medo de ser feliz, Emma. Parece que pensa que o caminho natural das coisas na sua vida é ser triste, sombria e macambúzia, e odiar seu emprego, odiar o lugar onde mora e não ter sucesso nem dinheiro, e Deus a livre de um namorado (e uma pequena digressão aqui: esse negócio de não se achar bonita está ficando chato, vou te dizer). Na verdade vou mais longe: acho que você gosta de se sentir frustrada e ter menos do que queria ter, porque isso é mais fácil, não é? O fracasso e a infelicidade são mais fáceis, porque você pode fazer piada com isso. Está incomodada? Aposto que sim. Bem, estou só começando.
Em, eu detesto imaginar você naquele apartamento terrível no meio daqueles cheiros e barulhos estranhos, com aquelas lâmpadas no teto, ou naquela lavanderia, -aliás, não há razão nesses dias e nessa época para alguém usar uma lavanderia, não tem nada de bacana ou de politicamente correto em lavanderias, são apenas deprimentes. Sei não, Em, você é jovem e é uma garota genial, no entanto sua ideia de diversão é lavar roupa. Acho que você merece mais que isso. Você é inteligente, engraçada e legal (muito legal, se quer saber) e, de longe, a pessoa mais inteligente que eu conheço. E (a esta altura vou tomar mais uma cerveja... e respirar fundo) é também uma Mulher Muito Atraente. E (mais cerveja), sim, eu também quero dizer "sensual", embora me incomode um pouco escrever essa palavra. Mas não vou rabiscar só porque é politicamente incorreto dizer que alguém é "sensual", pois isso também é VERDADE. Você é linda, sua velha rabugenta, e se eu pudesse te dar só um presente para o resto da sua vida seria este. Confiança. Seria o presente da Confiança. Ou isso ou uma vela perfumada.

David Nicholls, Um Dia

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Porta aberta

Minha patologia creio eu, é das mais comuns. Sinto constantemente aquele frio da falta, aquele vento na nuca que sempre vem da porta aberta que nunca conseguimos fechar. É aquele aperto no peito que te sufoca de vez enquanto, não é sempre, é só quando a mente se esvazia um pouco. As vezes nessa onda de pensamentos, que são quase como enciclopédias jogadas aos montes em sua cabeça com o objetivo de serem decoradas para ontem, me perco no fio da meada. Eu sei como foi o começo de tudo, aquelas fotos amareladas me contam boa parte. Eu sei o meio, tenho total noção do que acontece ao meu redor, talvez não tanta com o que se sucede com a minha vida e talvez isso seja o meu "que me espera lá na frente?". Eu não tenho nada que me afirme o futuro. Talvez isso seja para muita gente um alivio, o saber, eu prefiro descobrir aos poucos, me anima a ideia de ter uma novidade, uma pista do meu "caça ao tesouro" da vida a cada ano que passa. Tenho, como muitos, vários planos, mais chamados de 'sonhos'. Com certeza não realizarei todos mas se alguns deles eu, por minhas pernas, conseguir fazer acontecer, já direi que a vida valeu a pena. Ela já vale cada inspirada agora, cada ventinho frio da porta aberta que entra em mim, que me renova. Minha patologia creio eu, é das mais comuns, é a incerteza, quando meu caminho se complica por minha culpa pois vejo que há várias belas vielas que eu poderia seguir. Talvez seja uma característica essa desconfiança da vida, se for, por favor tempo, não me mude, deixe essa porta sempre aberta para que o vento frio me agite eternamente, e que ela se feche só depois de eu encontrar a chave certa pelo caminho.

terça-feira, 24 de julho de 2012

Quem dera eu

Para minha total infelicidade eu me encantei foi pela tua personalidade, pelas tuas músicas tão minhas, pelos teus livros tão bons, pelo teu gosto, teu jeito, pela mistura e o conjunto. Foi infelicidade minha, sim, pois quem dera eu ter me encantado só pelo teu sorriso perfeito, pelo teu jeito alegre, pela tua naturalidade ou teu cheiro. Quem dera eu. Se fosse uma escolha eu escolheria o test drive e me encantaria pelo teu conjunto de fora, eu só ouviria tua risada, me aconchegaria no teu abraço, te faria cafuné e se tudo isso me fizesse querer ficar eu encostaria meu ouvido no teu peito e ouviria teu coração, ele ia me dizer em que ritmo estamos, e se o meu estivesse na mesma batida eu ligaria o modo 'vai nessa garota' e começaria a te pedir um livro emprestado, aceitando uma dica de música, rindo das nossas bobagens, me aproximando com cautela. Quem dera eu ter essa escolha, esse cuidado não nos foi oferecido e talvez nosso tempo nos foi tirado. Acredito que reclamar dos rumos da sua trajetória é uma injustiça com seu futuro, ele depende disso, aprender a apreciar mesmo que as perdas é importante, imagine o que vira após, a melhor ocupação da mente é a imaginação.
Ocupada em observar as atenções do sr. Bingley para com a irmã, Elizabeth nem de longe suspeitava que começava a se tornar objeto de algum interesse aos olhos do amigo de Bingley. A principio, o sr. Darcy mal quis admirar que ela fosse bonita; no baile, olhara para ela sem qualquer admiração e, quando se encontraram pela segunda vez, olhou-a apenas para criticar. Mas, mal havia declarado, a si mesmo e aos amigos, não haver um só traço de beleza no rosto da moça, começou a achar que a bela expressão dos olhos escuros dava a ela um ar de excepcional inteligência. A essa descoberta sucederam-se algumas outras igualmente embaraçosas. Embora houvesse detectado, com olhar crítico, mais de uma falha na perfeita simetria de suas formas de moça, era forçado a admitir que sua silhueta era graciosa e agradável e, a despeito de ter declarado que suas maneiras não eram as de uma pessoa refinada, sentia-se atraído pela jovialidade de Elizabeth. De tudo isso ela não fazia ideia; para ela, ele era apenas o homem que não fazia questão de ser agradável e que não a considera atraente o bastante para ser tirada para dançar.

Jane Austen, Orgulho e Preconceito
Se quer saber minha opinião, nunca é tarde de mais ou, cedo demais pra ser quem quiser ser. Não há limite no tempo. Comece quando você quiser. Você pode mudar ou ficar como está. Não há regras pra esse tipo de coisa. Podemos encarar a vida de forma positiva ou negativa. espero que você encare de foma positiva. Espero que veja coisas que surpreendam você. Espero que sinta coisas que nunca sentiu antes. Espero que conheça pessoas que com um ponto de vista diferente. Espero que tenha uma vida na qual se orgulhe, e se você descobrir que não tem... Espero que tenha forças para conseguir começar novamente.

Benjamim Button 

terça-feira, 17 de julho de 2012

Não deixe seu mundo parar

É sufocante, desesperador, de enlouquecer. É medo, é raiva, um pouco de tudo junto. No fim é só vontade, mas vontade além do normal, é querer abrir as asas e desaparecer por ai, pousar em um lugar onde eu só saiba quem sou eu, e descobrir no fim quem realmente sou eu. É sentar e fechar os olhos, pensar de mais até o limite de saturação. Até onde você aguenta? Você sabe se tem controle de você?
Sua face aparenta a calma que seu coração não possui e você sustenta isso por tempo demais e se assusta quando sua energia de metamorfismo se esvai. Você é um ser sentimental demais para arcar com a falta de zelo que o mundo tem com você, mas é muito cabeça dura para admitir que precisa que alguém que olhe por ti e acaba fazendo de conta que isso não o atinge.
É a hora de se renovar, o que ficou no passado tem vários motivos para continuar lá e você mais motivos ainda para lutar por aquele futuro que vive sonhando. Corre menina, não deixe de sonhar que os sonhos são o combustível da vida e se desistir disso seu mundo irá parar. Não deixe seu mundo parar.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

Omne ignotum pro magnifico - O que é desconhecido soa magnifico.
L'homme c'est rien, l'ouvre c'est tout - O homem não é nada, a obra é tudo.

Sir Arthur Conan  Doyle, A Liga dos Cabeça-Vermelha
- E como sabe disso?
- Eu vejo, eu deduzo. Como é que sei que você se molhou todo recentemente, e que tem uma criada bastante desajeitada e descuidada?
- Meu querido Holmes - disse eu -,isto é demais. Você certamente teria sido queimado na fogueira se vivesse há alguns séculos. É verdade que fiz uma caminhada no campo na quinta-feira e que voltei para casa terrivelmente sujo.Mas como mudei minhas roupas,não consigo imaginar como você fez essa dedução. Sobre Mary Jane, ela é incorrigível, e minha esposa já a despediu. E, nesse ponto, outra vez falho ao tentar compreender como descobriu isso.
Ele riu sozinho e esfregou suas longas e nervosas mãos.
- É muito simples - disse -, meus olhos me dizem que no lado interno do seu sapato esquerdo, justamente onde a luz do fogo da lareira se projeta, o couro está arranhado por seis cortes praticamente paralelos. Foram obviamente causados por alguém que muito descuidadamente raspou as laterias da sola para remover lama incrustada.Por isso veja você, cheguei à dupla dedução de que você andou na rua sob um tempo terrível e de que tinha um exemplar particularmente ruim de criadagem destruidora de sapatos londrina. (...)
Eu não podia evitar o riso diante da facilidade com que ele explicou o seu processo de dedução:
- Quando ouço suas fundamentações - falei -, a coisa sempre parece tão ridiculamente simples que eu mesmo poderia fazer tais deduções,embora a cada passo do seu raciocínio eu fique desconcertado até que você o explique por inteiro. E assim mesmo ainda acredito que os meus olhos são tão bons quanto os seus.
- Exatamente - ele respondeu, ascendendo um cigarro e jogando-se em uma poltrona - Você vê,mas não observa. A diferença é clara. Por exemplo, você viu muitas vezes os degraus que vêm do hall até este quarto.
- Muitas.
- Quantas?
- Bem, algumas centenas de vezes.
- E quantos eles são?
- Quantos? Não sei.
- Exatamente. Você não os observou. E, mesmo assim, você os viu. Essa é justamente a questão, sei que há dezessete degraus porque já fiz as duas coisas: vi e observei. (...)

Sir Arthur Conan Doyle, As melhores histórias de Sherlock Holmes